Vidroplano
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Como anda o mercado de insulados no Brasil?

21/09/2023 - 15h35

Dos mais de 55 milhões de m² de vidros processados no ano passado em nosso país, apenas 0,6% (cerca de 313 mil) foi de insulado, também conhecido como vidro duplo. Mas, afinal, por que esse item se mantém na lanterna da lista de nossos produtos mais consumidos no Brasil, sendo que é uma solução extremamente versátil para a construção civil, com benefícios que aumentam o conforto das edificações?

Se você é leitor assíduo de O Vidroplano, se lembrará de que já abordamos esse tema algum tempo atrás. Como o assunto continua atual, voltamos a ele para tentar encontrar novas respostas a essa pergunta que não quer calar. A seguir, confira a percepção de processadoras em relação ao mercado de insulados, o que são mito e verdade sobre a aplicação desse material e qual a importância dos insumos para a eficiência da solução.

Andando, mas quase parado
O mercado brasileiro de insulados, segundo as fontes consultadas para esta reportagem, é atualmente mais conhecido pelo público e profissionais do vidro e da construção que no passado. “Porém, sua principal aplicação ainda é o mercado de refrigeração, que inclui refrigeradores comerciais e balcões para comércios, padarias, supermercados, açougues etc.”, comenta Ricardo Aragon, diretor técnico e comercial para a América Latina da Sagertec, fornecedora de insumos e equipamentos para a produção desse tipo de vidro.

Duas processadoras relataram para a revista o tamanho de sua produção de insulados. No caso da Rohden Vidros, em virtude da forte atuação no segmento de refrigeração comercial, insulados representam em torno de 20% de seu portfólio. A empresa, inclusive, conta com duas linhas para a fabricação do material. Já a PV Beneficiadora, que não atende esse setor, produzindo apenas para a construção civil, vê os insulados representarem apenas 1% das vendas – isso num mês “bom” de negócios.

“O Brasil, aparentemente sem uma razão plausível, é o país da América Latina com o menor nível de produção de insulado, muito abaixo da média da região”, afirma Luiz Garcia, diretor da Lisec Sudamerica, braço regional da fabricante de maquinários austríaca Lisec. “Acreditamos que, por meio da disseminação dos benefícios do material, essa situação deva se alterar, pois não pode ser possível que todo o resto do mundo utilize esse vidro caso não fosse adequado.”

Com a crescente busca por eficiência energética, aliada ao conforto térmico e acústico de moradias e ambientes de trabalho, o material pode, enfim, tornar-se uma escolha mais popular. “Vemos grande potencial de expansão nesse mercado para os próximos anos”, aposta o gerente de Produção da processadora Divinal, César Augusto Pereira. Para isso acontecer, no entanto, o setor vidreiro como um todo precisa desvendar alguns mitos relacionados ao produto.

Só para climas frios?
Formados por duas peças de vidro separadas por uma câmara interna com ar ou gás, os insulados têm uma importante função termoacústica. “Na Europa, esse tipo de vidro é obrigatório em algumas aplicações, além de ser recomendado em edificações comerciais como hospitais, laboratórios, restaurantes, bares e hotéis”, explica a gerente de Desenvolvimento de Produtos da Rohden, Edilene Marchi Kniess.

Os insulados funcionam como isolante térmico. “Vejamos o exemplo da refrigeração: o vidro é aplicado para isolar os produtos perecíveis da temperatura exterior mais elevada”, analisa Ricardo Aragon, da Sagertec. O conceito é o mesmo quando aplicado em prédios ou residências, mantendo a temperatura interna.

Por estarem ligados a climas frios, criou-se no Brasil a ideia de que seriam indicados somente para essas regiões. Isso é totalmente errado. “Por incrível que pareça, os países que mais o utilizam são os quentes, como as nações árabes. Dubai, por exemplo, é inteiramente feita de insulado”, revela Edison Claro de Moraes, diretor da Atenua Som, fabricante de soluções acústicas para edificações. Outra prova de que a teoria não se sustenta, conforme alerta Luiz Garcia, da Lisec, é o fato de que existe alto consumo desses vidros em locais com clima similar ao brasileiro, incluindo Austrália, México, Colômbia e países da África.

“Vizinhos como Chile, Argentina e Uruguai estão na nossa frente. Utilizam há mais tempo e em escala maior. Mas chegou a hora de crescermos também. A questão térmica é a bola da vez, pois a energia elétrica segue caríssima no Brasil, e o insulado permite um retorno de investimento maravilhoso ao longo dos anos, graças à economia de eletricidade”, analisa Moraes, da Atenua Som.

Alguns motivos para o pouco uso

  • Custo: por contar com várias matérias-primas envolvidas na fabricação (mais de uma peça de vidro, perfis, dessecantes, silicones de vedação), o insulado é mais caro que outros tipos de vidro. E até mesmo as esquadrias necessárias para recebê-los devem ser mais robustas;
  • Informação: insulados ainda são deixados de lado por especificadores (arquitetos, engenheiros, construtoras) como opção válida para seus empreendimentos muito pelo fato de os benefícios do produto não terem sido comunicados adequadamente;
  • Mercado imobiliário: a maior parte dos lançamentos da construção civil é composta por edifícios residenciais, que não se enquadram nos tipos de edificação que necessitam de desempenhos térmicos ou acústicos acima da média – a não ser em empreendimentos de luxo. Isso reforça a ideia, por parte das construtoras e incorporadoras, de que não é necessário investir muito nessas questões;
  • Forte presença do laminado: o vidro laminado já virou sinônimo de controle solar e conforto acústico. Por isso, é o preferido em especificações para edificações que precisem de um nível superior de conforto nesses quesitos.

Como reverter a situação?
Primeiro, é preciso olhar para as soluções disponíveis no setor vidreiro como partes de um todo, não como concorrentes entre si, como aponta Edison Moraes. “Existe algo muito ruim no mercado que é colocar um vidro contra o outro. É comum perguntar ‘qual o melhor, laminado ou insulado?’. Não tem nada a ver isso: um complementa o outro. Paremos de pensar assim.”

Essa mudança de pensamento ajudará a encontrar respostas que solucionam os motivos listados para o pouco uso desses vidros. Cada especificação tem uma história própria – uma instalação que funcionou em determinado prédio pode não ser a ideal para outro. Colocar isso na cabeça dos profissionais do ecossistema da construção é tarefa de nossa cadeia. “Devemos levar informação e conhecimento para o especificador e principalmente o consumidor final”, indica o diretor-executivo da PV Beneficiadora, Vinicius Moreira Silveira.

Para isso, deve-se investir em estudos que utilizem ferramentas de simulação computacional. Assim, será possível observar os ganhos reais de cada aplicação, incluindo a viabilidade de um investimento desse porte a longo prazo, o que poderá ajudar o empreendedor a escolher os insulados.

Um estudo recente do engenheiro, consultor e professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Fernando Westphal, mostra como a composição insulada ajuda no controle térmico. “Em climas brasileiros, esse tipo de conjunto pode diminuir a temperatura do vidro em até 8 °C em comparação com um monolítico ou laminado durante o verão. No inverno, o material pode garantir 14 °C a mais na superfície do envidraçamento. Isso proporciona maior sensação de conforto das pessoas próximas ao vidro”, explica Westphal.

Vale ressaltar ainda outros tópicos interessantes revelados pelo estudo:

  • A transmitância térmica do insulado (quanto de calor é conduzido de um lado a outro) é equivalente à de uma parede de alvenaria;
  • No Brasil, há economia de energia em regiões predominantemente quentes;
  • A melhoria no conforto ocorre em todos os tipos de clima;
  • Insulados assimétricos (com chapas de espessuras diferentes) com laminado em uma das faces trazem excelente desempenho acústico, equivalente a uma parede de alvenaria.

Insumos: a qualidade é essencial para o bom desempenho
A importância dos insumos usados na produção dos insulados para o desempenho térmico e acústico não pode ser subestimada. O vidro é apenas um elemento do conjunto: todos precisam estar alinhados para entregar a eficiência esperada.

“Se os selantes não forem eficazes, pode haver vazamentos de ar ou infiltrações”, explica César Pereira, da Divinal. “Em um clima com baixa temperatura, o ar gelado de fora pode infiltrar-se no interior. Isso também ocorre com o calor em climas quentes.” E a aplicação malfeita dos selantes pode acarretar outros problemas, como aponta Edilene Kniess, da Rohden. “O uso não uniforme ou o uso de uma quantidade abaixo do especificado por norma podem causar condensação interna, sendo necessária a substituição da peça.”

Os perfis espaçadores, responsáveis por manter as peças de nosso material separadas, evitam a formação do efeito chamado “ponte térmica”, no qual o calor ou frio são transferidos diretamente entre os vidros. “Isso ajuda a manter a temperatura interna estável e confortável, independentemente das condições climáticas externas”, revela Pereira, da Divinal.

O material desses perfis influencia no desempenho da solução. Os feitos de PVC têm menor transmitância térmica que os de alumínio, por exemplo. Existem também os chamados warm edge, fabricados com aço inoxidável ou plástico e capazes de manter a borda do vidro mais quente em até 65%, reduzindo o risco de condensação do ar dentro do conjunto.

De olho nos maquinários
As máquinas para a fabricação de insulado são outro elemento indispensável para se obter um produto de qualidade. “Não é só o insumo, o equipamento também faz a diferença. Eu vejo muito maquinário manual que não traz a menor garantia, depõe contra o mercado. Afinal, insulado não é só juntar dois vidros com um separador”, comenta Edison Moraes.

O coordenador de Qualidade e Lean da processadora GlassecViracon, Renato Santana, concorda: “Eu não diria que não seria possível fabricar manualmente, mas, sim, que não seria recomendado, pois o insulado precisa de um cuidado especial na hora da montagem”. Nesse sentido, uma linha automática se torna imprescindível para garantir a qualidade e vida útil do produto. “Essas máquinas têm a precisão correta nas etapas de limpeza, primeira selagem e prensagem. Uma falha em uma dessas etapas pode resultar no colapso do produto pouco tempo após a instalação.”

Exatamente por isso, as linhas automáticas estão entre as soluções atuais mais modernas. Com carregamento e descarregamento feito por robôs, ajudam a otimizar a produção. A Lisec, por exemplo, já comercializou várias desse tipo no Brasil, tanto para o mercado da construção (fachadas) como para o de refrigeração e linha branca.

Enchendo as câmaras
As câmaras dos insulados podem ser preenchidas com gases (argônio, criptônio ou xenônio), de forma a oferecer ainda mais isolamento térmico. Em casos nos quais um desempenho superior não seja necessário, preencher o conjunto com ar basta.

“O gás argônio é responsável por aumentar significativamente a propriedade térmica, pois inibe o movimento molecular, de modo que a transferência de calor é reduzida”, esclarece Edilene Kniess, da Rohden. “Também age intensificando a vida útil do vidro, pois atua na retirada de quase toda a umidade presente no ar contido na câmara. Além disso, não é tóxico e seu uso não afeta o meio ambiente.”

E as normas técnicas?
O insulado conta com uma norma técnica, a ABNT NBR 16015, que estabelece as características, requisitos e métodos de ensaio para esse tipo de vidro, utilizado na construção civil e em unidades de condicionamento térmico e/ou acústico.

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Caso tenha alguma dúvida sobre o conteúdo das normas vidreiras, fale com a associação.

Este texto foi originalmente publicado na edição 609 (setembro de 2023) da revista O Vidroplano. Leia a versão digital da revista.

Crédito da foto de abertura: srki66/stock.adobe.com




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