Fachadas inclinadas têm desafios especiais
21/10/2024 - 10h28
Projetar e instalar fachadas de vidro envolve diversos processos complexos – da especificação à instalação e manutenção, passando ainda pelo processamento correto das peças, manuseio etc. Se a fachada for inclinada, então, dá-lhe mais cuidados para serem levados em conta. Afinal, esse tipo de estrutura precisa de cuidados extras durante as diferentes etapas do trabalho.
Sabendo disso, O Vidroplano conversou com projetistas e instaladores para entender quais são os desafios que essas fachadas oferecem.
Positiva ou negativa?
O mais importante conceito para se analisar as fachadas inclinadas é o tipo de inclinação delas.
- Inclinação positiva: quando a projeção da fachada ocorre para dentro da edificação – nesse caso, a estrutura se assemelha a um escorregador;
- Inclinação negativa: quando a projeção ocorre para o lado externo da edificação – ou seja, a estrutura se assemelha a uma marquise.
É a partir dessa diferenciação que todo o projeto da esquadria e do vidro serão pensados. Por isso, você verá bastante os dois termos ao longo da reportagem.
Como fica a especificação
Os cálculos necessários para o dimensionamento da espessura dos vidros em fachadas inclinadas são mais complexos e exigem mais etapas do que para a vertical. É preciso considerar, por exemplo, tanto o peso próprio do vidro como as pressões de vento. “Com inclinação positiva, o vidro cria uma carga adicional sobre os suportes inferiores, o que aumenta a necessidade de reforços nesses pontos”, comenta o engenheiro-consultor da TG Technical Group, Maurício Margaritelli. “Com inclinação negativa, além da pressão negativa causada pelo vento, a tração nos sistemas de fixação é maior, exigindo maior resistência dos pontos de ancoragem e das vedações.”
Em relação às fachadas coladas com silicone estrutural, é essencial prestar maior atenção à estrutura de suporte. O silicone resiste aos esforços de vento, mas não pode ser responsável por suportar o peso do vidro. “Para isso, é necessário prever reforços mecânicos, como ganchos ou suportes secundários, que possam aguentar as cargas verticais. A omissão desse cuidado pode comprometer a segurança da fachada”, alerta Margaritelli. “Além disso, as larguras das juntas estruturais devem ser maiores, para suportar a força constante de arrancamento”, informa o diretor da Avec Design, José Guilherme Aceto.
O clima também deve ser levado em conta. Se a fachada estiver em uma região sujeita a neve, por exemplo, o peso dela precisa ser considerado em fachadas inclinadas positivamente. Esse não é o caso do Brasil, embora o Sul do País seja uma região marcada por frequentes geadas durante as épocas frias do ano – o que traz maior carga ao vidro instalado nesse tipo de estrutura.
Em busca da instalação perfeita
Parece óbvio, mas vale ser ressaltado: devido à inclinação, o acesso dos operários para a instalação desse tipo de fachada é muito mais complexo – e, por isso, equipamentos devem ser usados para superar esses obstáculos e oferecer a segurança necessária à equipe que está realizando essa atividade (como balancins). “Toda a operação logística de transporte vertical até a instalação é sempre um grande desafio. Outro aspecto importante é o cuidado que se deve ter com a precisão da montagem da fachada. Nesse caso é importante considerar equipamentos de controle de dimensão a laser, e até estações topográficas, para evitar desvios que venham a comprometer a qualidade final da esquadria”, afirma Petrucci.
Para o engenheiro Henrique de Lima, diretor-presidente da Itefal, o tipo de sistema da fachada influencia as dificuldades no momento da instalação. “O sistema unitizado requer maior cuidado na hora de encaixe e acomodação dos painéis. Os painéis precisam ser posicionados na angulação da inclinação e, como estão içados, esse processo requer mais atenção e habilidade”, comenta. “Já no caso do sistema stick, o principal cuidado está no equipamento auxiliar de instalação, uma vez que as inclinações interferem no distanciamento habitual de balancins, por exemplo, obrigando em algumas situações o trabalho com cabos guia ou avanços pantográficos, a fim de conseguir o acesso necessário.”
Outros tópicos relevantes para a hora de projetar
- Mais sobre os ventos: a pressão de vento em uma fachada inclinada é afetada pela geometria da estrutura. O vento pode gerar pressão positiva, quando empurra o vidro para dentro, e pressão negativa, chamada de sucção, quando puxa o vidro para fora. Essas variações afetam não apenas a resistência do vidro, mas também os perfis de ancoragem e os sistemas de fixação, os quais devem ser dimensionados para resistir a esses esforços combinados. Segundo Aceto, da Avec, o peso dos vidros laminados deve ser considerado como carga permanente nas fachadas de inclinação positiva quando submetidos à tensão máxima admissível de 5,7 MPa (megapascal, unidade para medir pressão), conforme indicam a ABNT NBR 7199 — Vidros na construção civil — Projeto, execução e aplicações e normas internacionais. Em uma instalação que sofrerá com rajadas de vento, esse valor aumenta para 23,3 MPa. “No entanto, muitas vezes, somente o peso das peças excede essa tensão, sendo um impeditivo para uso de chapas somente laminadas. Já para vidros com tratamento térmico, sejam temperados ou termoendurecidos, a tensão admissível passa a ser de 52 a até 93 MPa”;
- Vedação: numa fachada positiva, o sistema de vedação precisa ser determinado considerando a área de contribuição de água decorrente dessa projeção. “Nesse caso a geometria das gaxetas de vedação e dos perfis de alumínio deve ser desenvolvida para proporcionar o escoamento para o lado externo”, explica Crescêncio Petrucci, sócio-fundador da Crescêncio Engenharia. “Já na fachada negativa, as exigências em relação à estanqueidade da esquadria são diferentes, pois a gravidade atua sempre a favor”;
- Deflexão do vidro: dependendo da inclinação e da espessura do vidro adotado, o peso da chapa pode ocasionar flexão no centro dela, provocando um efeito de distorção óptica indesejado.
Como manter as estruturas em ordem
É possível afirmar que o processo de manutenção das fachadas inclinadas pode ser mais desafiador que a própria instalação da estrutura. “Diversas fachadas contemplam pinos receptáculos para ancoragem de equipamentos que propiciam acesso às fachadas. Há de se destacar também que, em função de seu posicionamento, fachadas positivas sofrem maior acúmulo de chuva bem como sujidades e, dessa forma, requerem limpeza em intervalos de tempos menores”, alerta Henrique de Lima, da Itefal.
Pinos de retenção (comumente mados de washing bolts) e pinos de desvio de direção são fundamentais para garantir aos operários as condições de segurança, equilíbrio e mobilidade necessárias durante o processo de limpeza e manutenção. Em alguns empreendimentos, o uso de equipamentos mecânicos como gôndolas ajuda de forma efetiva esse tipo de trabalho.
Por isso, é crucial monitorar regularmente o estado dessas fixações e reforços mecânicos, especialmente em fachadas coladas com silicone estrutural, para garantir que os sistemas estejam funcionando conforme o projeto.
Eficiência energética
“A escolha correta da inclinação, combinada com vidros de controle solar, pode reduzir o consumo de energia no edifício”, explica Maurício Margaritelli. “No entanto, inclinações malprojetadas podem resultar em problemas de superaquecimento, especialmente em fachadas com inclinação positiva e grande exposição solar.”
Nas fachadas com inclinação positiva, a exposição aos raios solares é mais prolongada, já que o ângulo amplifica a exposição direta ao Sol, aumentando o ganho térmico e fazendo com que a temperatura do vidro atinja valores mais elevados.
Por isso, o dimensionamento da espessura e a escolha da peça devem considerar o acréscimo de temperatura. Para os casos de fachadas com inclinação negativa, esse tipo de preocupação é relativamente menor.
Foto de abertura: Levi Gregorio
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