Vidroplano
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Os fatores que influenciam na execução correta da têmpera

22/11/2019 - 14h39

Encerrando a série de reportagens sobre beneficiamento de vidro (que começou em agosto e já abordou corte, lapidação e serigrafia), chegamos à têmpera. O temperado é o produto de valor agregado mais produzido por nosso mercado entre os vidros não automotivos, segundo dados do Panorama Abravidro 2019. Por isso mesmo, entender as boas práticas dessa atividade é fundamental.

Nas próximas páginas, conheça a tecnologia dos fornos, os fatores que influenciam o processo térmico convencional e a importância da manutenção preventiva dos equipamentos.

As etapas da atividade
Cláudio Lúcio da Silva, instrutor técnico da Abravidro, explica como se dá a têmpera:

1. No forno, o vidro é aquecido de 620 a 640 °C;

2. Em seguida, passa por um módulo de resfriamento que consiste em duas partes distintas. A primeira utiliza jatos de ar para provocar um “super-resfriamento”, fazendo a temperatura cair de 130 a 150 °C. A pressão de sopro e a taxa de extração de calor são específicas para cada espessura das peças;

3. Essa mudança repentina na temperatura causa um rearranjo molecular no vidro, o que aumenta seus níveis de tensão interna;

4. A segunda parte do resfriamento tem a função de fazer as chapas retornarem à temperatura ambiente.

A “receita” da têmpera
Vários fatores influenciam os ajustes dos parâmetros técnicos do aquecimento e resfriamento dos fornos, segundo informa Cláudio Lúcio. São eles:

– Tipo, cor, espessura, dimensões e forma das peças de vidro;

– Tipo, dimensões e posição dos furos e recortes nessas peças;

– Tipo e qualidade técnica da lapidação feita anteriormente;

– Nível de limpeza e secagem das peças;

– Temperatura ambiente;

– Umidade relativa do ar;

– Vazão, direção e velocidade do fluxo de ar ao redor do aquecedor e resfriador;

– Filtragem do fluxo de entrada dos ventiladores do sistema de resfriamento;

– Temperatura inicial das peças antes de passar pelo processo;

– Formação da carga das peças na entrada do forno;

– Temperatura das peças na saída do aquecimento — antes da entrada do resfriamento;

– Temperatura das peças após passar pelo resfriamento.

Tecnologia de ponta
Os fornos modernos trazem funções impensáveis até pouco tempo atrás. “Sistemas de convecção temperam vidros baixo emissivos (low-e) e refletivos, proporcionando economia de energia, entre outros benefícios”, explica o diretor da Sglass, Sandro Eduardo Henriques. Sistemas de monitoramento por câmara térmica permitem maior controle da produção e otimização de carga, com acompanhamento em tempo real, por celular ou computador, das peças saindo do forno. Há também softwares, como alguns produzidos pela própria Sglass, que controlam desde a movimentação dos roletes de sílica da célula quente até o acionamento das resistências e o funcionamento das zonas de aquecimento.

Atualmente, os equipamentos podem ser customizáveis, como indica Moreno Magon, vice-presidente de Vendas e Serviços para América do Sul da finlandesa Glaston. “As tecnologias são configuráveis em função de cada necessidade do cliente”, afirma. “Para cada tipo de produto, existem soluções de aquecimento e resfriamento inteligentes, respondendo à revolução da Indústria 4.0 e envolvendo a digitalização dos processos para tomadas de decisão rápidas e eficientes.”

Fornos com colchão de ar também oferecem novas formas de trabalho. Neles, o vidro não é tocado por qualquer material sólido enquanto é temperado. “Desenvolvido especialmente para uma produção seriada com alta produtividade, esse sistema é particularmente adequado para vidros revestidos, como os low-e”, afirma Giorgio Martorell, gerente de Vendas da Lisec. “O vidro com revestimentos, que deve apresentar demanda crescente nos próximos anos, levará a um processo mais complexo e demorado no caso de tecnologias convencionais.” Daí vem a necessidade de maquinários específicos para isso, como o Aeroflat, da Lisec. Vale lembrar ainda que outras empresas também produzem equipamentos modernos, como a italiana Keraglass.

tecnologia

Como solucionar falhas?
Uma têmpera malfeita pode acarretar graves defeitos nas placas, incluindo, por exemplo, marcas dos rolos nas superfícies do vidro, lascas com arestas cortantes nas bordas, quebras no aquecimento ou resfriamento, empenamento e até mesmo fragmentação acima ou abaixo da tolerância das normas técnicas. O que fazer para solucionar isso tudo? “O mundo da vidraria é feito de detalhes. A soma desses detalhes fazem o resultado geral”, explica Cláudio Lúcio. “Quando não se tem conhecimento adequado, as perdas são aumentadas e os problemas se tornam crônicos.”

As causas para isso envolvem, entre outras considerações:

– Falta de um sistema de gestão da qualidade profissional;

– Falta de treinamento e capacitação não só dos operadores, mas também do corpo de vendas e direção da empresa;

– Inadequações em especificações, projetos e aplicações do temperado;

– Inadequações no corte e destaque do vidro;

– Manuseio, preservação e transporte entre etapas do beneficiamento feitos de forma inadequada;

– Lapidação, furação e/ou recorte resultando em peças com lascas e microtrincas;

– Adoção de layout equivocado no forno de têmpera, resultando em fluxos de vento diferencial significativos e intermitentes pelas laterais do aquecedor e do resfriador;

– Falta de acondicionamento técnico do fluxo de entrada e saída de ar dos módulos de resfriamento e dos ventiladores.

Para saber como acabar com retrabalhos e processos sem padronização, fique atento: a Especialização Técnica Abravidro tem um módulo específico sobre têmpera. Seu conteúdo é teórico e prático, sendo aplicado na própria empresa. Para mais informações, entre em contato pelo e-mail abravidro@abravidro.org.br ou telefone (11) 3873-9908.

sglass

Atenção para a manutenção
Segundo o instrutor técnico Cláudio Lúcio, a manutenção de maquinários ainda não é encarada com a seriedade que deveria ser no setor vidreiro. Veja sua análise: “É algo inconcebível de não ser feito em outros mercados. Mas, para o nosso, é considerado como uma coisa normal ou aceitável de se abrir mão, principalmente em épocas de crise”.

A falta de manutenção gera degradação gradual nos equipamentos, o que afeta diretamente a qualidade da produção. Os desempenhos produtivos e técnicos caem, as perdas e retrabalhos aumentam, os custos operacionais disparam. “Em empresas carentes de um sistema de gestão profissional, essa mudança para pior pode passar despercebida. E isso vai além da questão da operação, atingindo também a reputação e prosperidade da processadora”, informa Cláudio.

Somente com a checagem das máquinas em dia será possível otimizar o aproveitamento da carga do forno. Quanto maior a metragem média por unidade de tempo de processamento, maior a produtividade e menor o custo operacional.

 

Os diferentes processos
O vidro pode ser temperado na:
– Vertical;
– Horizontal;
– Inclinado (com colchão de ar).

O trânsito de peças no forno pode ser:

- Intermitente
Produção com intervalos;

- Contínuo
Produção sem paradas;

- Por batelada
Produção de uma porção grande de chapas de uma vez.

São três os sistemas de movimentação dentro do forno:

- Pinçamento
Equipamentos com pontas “pinçam” o vidro;

- Rolos
As peças deslizam por cima de uma esteira com rolos;

- Colchão de ar
Fortíssimos jatos de ar fazem com que a chapa “flutue” e não entre em contato com superfícies sólidas.

 

A questão da anisotropia
Em O Vidroplano de fevereiro de 2018, uma matéria especial comentou sobre a anisotropia, fenômeno óptico que ocorre nos vidros em decorrência do tratamento térmico pelo qual passam quando são temperados ou curvados, por exemplo. Manifesta-se como manchas (que podem ser severas ou até indetectáveis) em nosso material, visíveis em determinadas condições de luz e posições de observação. A norma NBR 14698 — Vidro temperado define a anisotropia como “característica óptica do vidro temperado inerente ao processo de têmpera”.

Mas o que causa a anisotropia? A hipótese mais relevante é a rapidez do aquecimento da peça no forno dentro da faixa de 490 a 550 ºC. Quanto maior a velocidade para aquecê-la, mais o efeito poderá aparecer.

Outros fatores influenciam a sua aparição, incluindo:

– Homogeneidade dos irradiantes de infravermelho, faixa de emissão de infravermelho e ajuste do perfil térmico;

– Condições técnicas do sistema de aquecimento, conservação dos rolos do aquecedor e refratários;

– Temperatura final alcançada pelo vidro que sai da zona de aquecimento — deve ser sempre maior que 620 ºC e menor que 640 ºC;

– Ajuste de emissividade do medidor de temperatura a laser em função do tipo, cor e espessura da peça;

– Redução significativa da velocidade de oscilação, ou mesmo a paralisação da peça, sob ação do jato de ar do resfriador, caso a temperatura medida ainda não esteja abaixo de 490 ºC.

É possível controlar a anisotropia? Sim. Para isso é necessário:

– Conhecer tecnicamente a física envolvida na têmpera térmica;

– Utilizar parâmetros técnicos corretos;

– Ter maquinários com tecnologias, conservação e manutenção adequadas;

– Operá-los corretamente.

Alguns fornos incluem sistemas para amenizar as manchas, como aponta o diretor e coordenador de Vendas da Keraglass, Maicol Spezzani: “Temos um sistema para temperar o vidro em passagem que conta com furos para a saída do fluxo de ar dos sopradores com diâmetros diferentes, e deslocados uns dos outros, reduzindo drasticamente esse fenômeno”.

A Glaston, por sua vez, desenvolveu o iLooK Anisotropy, solução online que visualiza e quantifica o nível de anisotropia. Assim, os processadores podem monitorar seus produtos, experimentar ajustes de máquinas e melhorar métodos de produção.

 

Já pensou em certificar seu temperado?
A certificação do temperado, que segue a Portaria Inmetro Nº 327, também contribui para o controle de qualidade do produto e detecção de problemas no processo produtivo. A Abravidro oferece consultoria para empresas interessadas. Para mais informações, entre em contato com o consultor Edweiss Silva, pelo e-mail esilva@abravidro.org.br ou telefone (11) 3873-9908.

Este texto foi originalmente publicado na edição 563 (novembro de 2019) da revista O Vidroplano. Leia a versão digital da revista.



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