Vidroplano
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A luz que faltava para o crescimento

22/10/2018 - 09h00

Em abril do ano passado, O Vidroplano publicou uma reportagem, que estampou a capa daquela edição, apontando o segmento fotovoltaico como uma grande oportunidade de negócios para o setor vidreiro nacional. Afinal, o vidro é essencial para os módulos que captam a luz solar e geram energia.

Hoje, esse mercado está ainda mais propício para investimentos: o número de fabricantes de módulos no País cresceu, foram criados canais de financiamento para fomentar esse ramo e a produção de energia é cada vez maior. Por isso, decidimos voltar ao tema.

Como é a presença de nossas companhias nesse setor? Será que estamos prestando atenção a esse mercado? O que fazer para atuar nele? Essas e outras respostas, você confere a seguir.

Os motivos do crescimento
DCIM100MEDIADJI_0311.JPGUma explicação bastante óbvia é a quantidade de Sol que o Brasil recebe: a região menos ensolarada por aqui possui radiação maior que a região mais ensolarada da Alemanha — uma das nações que mais usam esse tipo de energia. Temos um potencial gigante que já começou a ser aproveitado.

A Resolução Normativa nº 687/2015, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que atualizou a nº 482/2012, foi o marco regulatório do segmento, consolidando o interesse das empresas em investir. Marcas líderes do mercado mundial, como a alemã Calyxo e a chinesa Trina Solar, possuem representações no País e companhias brasileiras que atuam no desenvolvimento de projetos ganham espaço — a Blue Sol Energia Solar já conta com dez unidades franqueadas no interior de São Paulo.

Incentivos de redução tributária, como o Convênio ICMS nº 16/2015, que autoriza governos estaduais a isentar o Imposto sobre mercadorias e serviços (ICMS) de energias renováveis, são mais comuns, embora ainda não seja o ideal (como se verá mais para frente nesta matéria). E vale citar ainda a maior presença de grandes usinas, como a presente em João Pinheiro (MG), considerada a primeira fazenda solar do Brasil.

Para o alto e avante
Todo esse cenário contribuiu para que o Brasil garantisse um lugar entre os trinta maiores produtores desse tipo de energia no mundo. Falta bastante para atingir os líderes do setor, como a China, que conta com cerca de 130 GW instalados. Mas o cenário é promissor: dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) revelam que a produção cresce 100% ao ano desde 2012 — e nos últimos tempos deu-se um salto ainda maior:

– Em 2016, o Brasil gerou 90 MW;
– Um ano depois, passou a gerar 1.150 MWaumento de mais de doze vezes.

Para 2018, a projeção da entidade é que tenhamos 2.400 MW operacionais (mais uma vez, crescimento superior a 100%).

Desse total:
85% virão da geração centralizada, voltada para a produção em grande escala (como em usinas fotovoltaicas);
15% da geração distribuída, direcionada ao consumo próprio (residências, empresas e condomínios).

Isso, no entanto, equivale a menos de 1% da potência instalada na matriz elétrica brasileira. Por outro lado, o viés de alta se manterá: números da Empresa de Pesquisa Energética, do Ministério de Minas e Energia, indicam que a energia solar chegará a 10% da potência instalada em 2030.

Esses atuais 1.150 MW representam, grosso modo, segundo as contas da Absolar, cerca de 3 milhões de módulos — ou 5 milhões de m² de vidro aplicados. Isso sem levar em consideração o aumento deste ano e dos próximos. O número também não inclui o maior uso do módulo vidro-vidro (nosso material está em ambas as faces, de forma a encapsular as células fotovoltaicas dentro de uma peça laminada), que tem tudo para se tornar um padrão de aplicação arquitetônica dos fotovoltaicos. Ou seja, a demanda só vai se multiplicar.

É hora do vidro nacional

Algumas companhias vidreiras já se beneficiam desse crescimento e atuam de maneira sólida nesse negócio. A DVM é um exemplo: criou, em 2016, uma divisão especializada, a DVM Solar. “A empresa atua na elaboração de projetos, instalação dos sistemas fotovoltaicos, monitoramento e suporte pós-venda”, explica o diretor Luís Augusto Knorst. Para isso, compram os módulos de fornecedores nacionais ou estrangeiros e os revendem aos clientes, já que a tecnologia empregada para sua montagem é bem específica.

DCIM100MEDIADJI_0290.JPGO negócio deu tão certo que a processadora montou uma usina de geração (foto ao lado) para alimentar sua planta: com 648 módulos instalados, produz mais de 25 mil kWh por mês, sendo a maior usina em atividade no Maranhão (e essa pode ser uma solução interessante para nosso setor).

A Penha Vidros, de São Paulo, também trabalha com fotovoltaicos. Ela oferece vidros em parceria com empresas fabricantes desses equipamentos com o foco em projetos especiais e customizados. Vale citar ainda uma empresa brasileira que não é de nosso setor, mas tem tudo a ver com vidro. A Sunew é uma das líderes mundiais na pesquisa dos fotovoltaicos orgânicos (OPV) — filmes plásticos impressos com tinta semicondutora usados nos modelos vidro-vidro. Sua fábrica, em Belo Horizonte, pode produzir até 400 mil m² de OPV por ano, que já foram aplicados em obras grandiosas.

Mercado: um problema a solucionar…
Existe um entrave, no entanto: o vidro processado em nosso país é mais caro que o importado. Nossa reportagem de maio de 2017 já mostrava isso — a Dya Energia Solar, produtora de módulos, relatou na época que chegaram a usar temperados brasileiros, mas o valor era “muito superior”.

Quando a equipe de O Vidroplano visitou a feira Intersolar South America 2018, no fim de agosto deste ano, algumas empresas relataram não existir perspectiva, em curto prazo, de usarem o material fabricado por aqui. As justificativas para isso eram o preço maior e também a necessidade de homologar novamente os sistemas em caso de troca de qualquer componente, processo muito custoso às companhias.

“O principal papel do governo seria o de incentivar a instalação de novas fábricas e diminuir os impostos incidentes sobre as matérias-primas”, analisa Luís Knorst, da DVM. Segundo ele, os módulos nacionais são em torno de 20% mais caros se comparados aos produzidos no exterior.

Para Thiago Mattar, responsável pelo setor de Business Inteligence da Sunew, a concorrência com os produtos chineses é desleal. “A política estatal de subsídios e os custos reduzidos com mão de obra e energia fizeram com que a China dominasse e concentrasse o mercado mundial de módulos. Existe hoje praticamente um monopólio chinês.” Isso explica o fato de a maioria dos equipamentos instalados aqui ser chinesa ou possuir tecnologia desse país.

…e suas possíveis soluções
A Absolar trabalha em uma proposta que pode ajudar a atual situação: a inclusão dos insumos produtivos do setor fotovoltaico, abrangendo o vidro, no Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores (Padis), do governo federal. Isso permitiria diminuir a tributação e assim reduzir o preço do módulo produzido no Brasil, aumentando a competitividade nos mercados interno e externo.

“O setor vidreiro, como potencial fornecedor, pode ajudar a avançar esse tema, para que tenhamos uma presença maior da fabricação nacional no mercado, fazendo frente aos importados”, reflete o CEO da Absolar, Rodrigo Sauaia. A proposta ainda não tem data para ser publicada na forma de decreto ou portaria. Por isso, segundo Sauaia, a entidade está de portas abertas para empresas vidreiras interessadas em conhecer melhor esse mercado. “O networking e a troca de experiência entre os dois setores são essenciais.”

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Incentivos para investir…

Este ano, algumas linhas de financiamento públicas e privadas foram criadas para o fortalecimento desse segmento, o que pode ajudar nossas companhias a entrar de vez no segmento. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) possui o Finame Energia Renovável, com verba de R$ 2 bilhões, voltado para pessoas físicas e jurídicas. O objetivo é fomentar a aquisição e comercialização de sistemas de geração, incluindo serviço de instalação e capital de giro associado.

Já o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) disponibilizou um produto que une linhas de créditos de US$ 25 milhões a uma cobertura securitária para riscos de desempenho, indicado para pequenas e médias empresas interessadas no assunto.

…e para usar a energia solar
O mercado vidreiro, portanto, tem incentivos para atuar nesse negócio — e não só como fornecedor de matéria-prima, mas também como usuário. Da década de 1970 para cá, o preço de 1 watt de energia fotovoltaica caiu de US$ 76 para menos de US$ 0,30, segundo dados da Absolar. Enquanto isso, outros tipos de energia só aumentaram.

Com a solar, é possível controlar custos, já que os sistemas geradores têm vida útil longa, acima dos dez ou quinze anos. “Permite ainda o planejamento orçamentário de custos de insumos. E isso com sistemas instalados nas fábricas ou contratando no mercado livre”, afirma Sauaia. Um exemplo concreto: a já citada usina da DVM, que alimenta a própria planta, garante a incrível economia de 40% nos custos de energia da empresa.

 

avec

A fachada do Centro Empresarial Sêneca, em São Paulo, cujo projeto foi desenvolvido pela Avec Design, possui laminados de controle solar com células OPV (da Sunew) em determinadas áreas da estrutura — os vidros foram fornecidos pela Cebrace e processados pela Unividros. Segundo o diretor da Avec, José Guilherme Aceto, “essa solução é versátil e representa o futuro da aplicação dos fotovoltaicos no Brasil”, não mais como algo adicionado aos edifícios, mas sim como elemento arquitetônico

 

O tipo de vidro ideal
A função básica do vidro é proteger as células fotovoltaicas contra chuva, granizo, sujeira etc. e garantir que a luz solar entre em contato com elas.

Dessa forma, por ser mais transparente que outros tipos, o temperado de baixo teor de ferro é o indicado para uso nos módulos. Esse vidro, mais conhecido como extra clear, atualmente é fabricado no Brasil pela Cebrace (Diamant) e importado pela AGC (Planibel Clearvision) e Guardian (UltraClear).

Existem no mercado equipamentos especiais para o processamento dos vidros destinados à energia solar. A Lisec, por exemplo, tem o forno de têmpera Aeroflat, com sistema de flutuação de ar, e o de laminação VPL, que trabalha em módulos vidro-vidro. A Glaston também oferece fornos de laminação para trabalhar com esse tipo de módulo (o ProL), assim como os de têmpera da linha RC e FC.

Este texto foi originalmente publicado na edição 550 (outubro de 2018) da revista O Vidroplano. Leia a versão digital da revista.



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