Com quase quarenta anos de trajetória, o Grupo Tecnovidro já atendeu diversos ramos consumidores de vidro: começou na construção civil, passou pelo segmento moveleiro e de linha branca, e, agora, está focado no automotivo, além de se preparar para atender o chamado mercado de linha amarela, produtor de equipamentos como escavadeiras e tratores usados no agronegócio e construção. Ao longo de todo esse tempo, a processadora soube mostrar uma importante lição ao setor: é preciso estar atento às tendências e oportunidades para ser competitivo e manter a relevância.
Busca por novos caminhos
A entrada da empresa no ramo em que se tornou bastante conhecida (o de linha branca, para o qual até criou uma marca, a Casavitra, voltada para produtos como cooktops e fornos) deu-se a partir de uma oportunidade surgida no início de sua trajetória. Farroupilha, a cidade onde está instalada, localiza-se próximo aos polos moveleiro de Bento Gonçalves e metal-mecânico de Caxias do Sul, na Serra Gaúcha. Assim, o grupo passou a fornecer vidros para máquinas de lavar roupas produzidas por uma fabricante da região. “No entanto, a evolução do mercado, as especificações e a guerra de preço acabaram nos afastando, tirando nossa competitividade dentro desse segmento”, explica o diretor-executivo Marco Aurélio de Bastiani. “Então, nós vimos no mercado automotivo uma coisa do nosso perfil: um vidro mais especial, com uma especificação técnica robusta, com uma curva de desenvolvimento maior. E aí partimos para esse lado.”
Marco de Bastiani, fundador e diretor-presidente da processadora, pai de Marco Aurélio, relembra que, quando atendiam o ramo moveleiro e de linha branca, o consumo de vidro era bem maior que o atual. “Passamos a ver, então, esse movimento de diminuição, um vidro que não tem valor agregado nenhum. Por isso, resolvemos partir para o caminho do automotivo, já que nossa localização é perto de montadoras de ônibus e porque queríamos fazer um vidro mais elaborado, com certificações.”

Foto: Agência D3M
Adaptação
O segredo para encarar uma mudança desse porte é se adequar às especificidades da nova cadeia, tanto no quesito mercadológico como em relação às tecnologias produtivas. “O segmento de ônibus é um de nossos focos. E, mesmo para um mercado em que as pessoas podem imaginar que seja mais padrão, o ônibus brasileiro é 100% customizado”, conta Marco Aurélio. “Nos últimos dois meses, por exemplo, a gente teve um gargalo muito grande para vidros curvos. Mas, nos dois meses anteriores, a necessidade era de vidros com furação. Tudo depende muito da licitação em que uma fabricante entra e também se vai exportar o veículo para algum país. Isso acaba mudando toda a característica de produção.”
Para abrir ainda mais possibilidades, a empresa aportou mais de R$ 8 milhões no primeiro semestre deste ano para a aquisição de um forno chinês visando à produção de vidros temperados de dupla curvatura, uma tecnologia essencial para atender demandas automotivas de alta complexidade. O investimento proporcionará um salto na capacidade produtiva, passando de 35 mil para 50 mil m² de vidros mensais, com expectativa de aumentar o faturamento e garantir crescimento de 10% ao ano até 2030. Outros investimentos realizados têm como principal pilar o manuseio do vidro. “A gente fez um levantamento que mostrou que essa etapa é a em que mais se perdem peças na produção. O risco, a trinca e a quebra geralmente se originam no excesso de manuseio. Nossos investimentos têm sempre essa característica, da otimização de mão de obra, aumento de segurança e redução de tempo de atravessamento das chapas”, comenta Marco Aurélio.
Conheça o Grupo Tecnovidro
- Instalada em Farroupilha (RS)
- Quase 40 anos de história no setor
- 270 funcionários
- O temperado é o carro-chefe de seu portfólio – bastante usado na indústria de ônibus na versão curvo cilíndrico (com curvatura em um sentido). No momento, a empresa faz também o temperado curvo esférico (com dupla curvatura) e, desde 2022, produz laminados para para-brisas

“O treinamento e a valorização da mão de obra são fundamentais”
Diretor-presidente Marco de Bastiani e diretor-executivo Marco Aurélio de Bastiani, do Grupo Tecnovidro, explicam a importância da qualificação para a implementação de novas tecnologias
Comparando-se com outros setores, o automotivo, cuja especificação técnica é mais robusta, é um ramo mais exigente?
Marco Aurélio de Bastiani – A exigência torna-se maior até nas pessoas. Além do investimento em maquinário, você tem de investir muito forte na educação, na qualificação dos profissionais. E esse é um investimento grande, principalmente com os desafios encontrados na mão de obra atual – porque, às vezes, você aposta, faz treinamento e, ainda assim, acaba perdendo a pessoa. O que também é normal, é do jogo, tudo bem… Mas, sim, você exige mais da equipe como um todo, pois o leque de diversidade técnica exigida se amplia bastante.
Marco de Bastiani – Nós estamos preparando a fábrica para entrar no setor agrícola, de cabines para trator, que exige um vidro um pouco mais elaborado do que o vidro para ônibus. Então, a gente está montando o forno para fazer dupla curvatura e atender o mercado. A ideia é ir forte para esse segmento também.
Sobre o forno, o Grupo Tecnovidro participou recentemente do Gramado Summit, um dos maiores eventos de inovação da América Latina, onde vocês apresentaram um projeto para a produção de temperados de dupla curvatura para máquinas agrícolas e de construção, desenvolvido em parceria com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Qual é a relação desse projeto com a aquisição do forno?
MAB – Estão diretamente ligados. O Finep é um programa que exige muitas contrapartidas da empresa para conseguir crédito subsidiado – afinal, hoje temos uma taxa de juros completamente abusiva no País, apesar de entendermos suas razões. Ao mesmo tempo, o Finep exige a qualificação do pessoal e certificações. Não é só o maquinário: temos de fazer toda a estrutura caminhar de maneira uniforme, para que consigamos entrar nos mercados em que desejamos trabalhar de uma maneira bem sustentada.
Por falar em tecnologias, o setor vê, em eventos e feiras, muita discussão sobre a questão da automação, das oportunidades que o conceito oferece no sentido de reduzir perdas e otimizar processos. Como vocês enxergam o tema?
MAB – Existe muita oportunidade, mas cada empresa já tem o seu parque de máquinas estabelecido. Então, são necessárias automações dentro do existente. Não é a regra do mercado ter uma capacidade de investimento enorme para fazer uma fábrica do zero – o que, aí sim, possibilitaria uma gama enorme de automações. Você vai fazendo movimentos pontuais para melhorar a questão: compra uma máquina, tenta ligá-la na outra, tenta tirar duas pessoas no final de um processo e colocá-las para um trabalho mais qualificado. É assim que temos feito. São pontos de melhoria que a gente enxerga dentro da fábrica e nos quais se atua de acordo com a capacidade de investimento.
Vocês têm colhido bons frutos com essas automações pontuais?
MAB – Sim. A nossa perda de material tem baixado constantemente. Isso também é um trabalho de educação, de acompanhamento, que precisa ser feito diariamente. Às vezes, você tem um salto, aí descuida um pouco e perde aquela melhoria. Então, também tem o trabalho de conscientização. Isso demanda tempo, esforço, treinamento. É por isso também que a empresa tem de estar sempre atuante – uma gestão de longe não funciona tão bem assim para o nosso setor. E acho que isso não se aplica só ao mercado do vidro. Se você pegar a produtividade do Brasil como um todo e comparar com o mundo, a gente não consegue competir com mercados mais ou menos parecidos com o nosso, como México ou Turquia. A gente tem um desafio muito grande, e pra isso eu acho que o treinamento e a valorização da mão de obra são fundamentais. Só assim você conseguirá realmente ter um ganho de produtividade que se sustente por um período maior.
E não podemos falar de tecnologia sem mencionar sustentabilidade. Essa discussão está mais madura na Europa, nos Estados Unidos, no Hemisfério Norte de modo geral, do que aqui no Brasil e na América Latina. Como vocês encaram o assunto?
MB – A gente se preocupa muito com a questão do meio ambiente. E é um tema muito caro. Competir com os asiáticos – que não se preocupam tanto com a sustentabilidade e com outras coisas, como direitos do trabalhador –, tanto para nós como para o mundo inteiro, é muito caro, né? Então, a gente perde competitividade também em função disso. Mas o Grupo Tecnovidro respeita muito o meio ambiente e a nossa comunidade. Nossos clientes fiscalizam de que maneira nós tratamos o meio ambiente. O mundo inteiro já está se preocupando com a sustentabilidade e, por isso, teremos um lugar bem melhor para viver e trabalhar.
Foto de abertura: Agência D3M