Vidroplano
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Vidro contribui para arquitetura sustentável

27/09/2022 - 13h48

Mês passado, vimos aqui em O Vidroplano o que pode ser feito pelas indústrias vidreiras ao redor do planeta para diminuir a emissão de poluentes durante a fabricação do produto. Agora, é a vez de conhecer o passo seguinte na busca pela sustentabilidade: após sair da fábrica, como nosso material pode contribuir para edificações mais “verdes”?

A seguir, confira um estudo sobre o impacto ambiental do uso de vidros em fachadas, a importância do retrofit para construções antigas conseguirem atingir um melhor desempenho energético e como a arquitetura está se preparando para um futuro marcado por um clima mais extremo, com frentes frias e de calor fora de época.

Prontos para o futuro?
Como apontado na matéria de agosto, as mudanças climáticas causadas pelo aquecimento global já são uma realidade mundial. Outro exemplo brutal disso pôde ser visto no final do mês passado no Paquistão: chuvas intensas deixaram um terço do território do país asiático inundado, afetando diretamente cerca de 33 milhões de pessoas e matando mais de mil. Existem ainda os prejuízos financeiros aos cofres públicos: somente em 2017, fenômenos como incêndios florestais, enchentes e furacões custaram mais de US$ 300 bilhões aos EUA. Para evitar que catástrofes como essas virem rotina, o aumento da temperatura média do planeta não pode ultrapassar 1,5 ºC até o fim deste século – e isso só será possível com uma grande diminuição da emissão de poluentes em todo o mundo.

Atualmente, as estações climáticas estão menos definidas. Frentes frias no verão ou calor intenso no inverno, por exemplo, eram raridade, hoje são comuns – alterando o conforto térmico nas residências e locais de trabalho. Nossa vida, portanto, é afetada pela questão mesmo quando estamos longe de desastres. Por isso mesmo, surge a pergunta: a arquitetura está preparada para os desafios presentes e também futuros?

De acordo com Emmanuelle Gouillart, diretora-científica dos laboratórios da Saint-Gobain Research em Paris (França), a construção civil mundial é responsável por incríveis 40% de todas as emissões de dióxido de carbono (CO2) do planeta – considerando a fabricação dos materiais, a construção propriamente dita e o consumo de energia elétrica pelos usuários. Isso explica a necessidade de o setor como um todo se voltar para a sustentabilidade.

“O foco atual é no desenvolvimento de ‘edificações resilientes’, as quais podem ser adaptadas em pouco tempo e com pouco custo diante de prováveis alterações climáticas e desastres. O mercado da construção civil está atento a isso”, comenta o engenheiro Fernando Simon Westphal, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). “No final de 2020, o Instituto Americano de Arquitetos publicou uma declaração da indústria em prol do desenvolvimento desse tipo de construção, focando na promoção do uso de energias renováveis, com estratégias passivas de aquecimento e resfriamento”, destaca o engenheiro. “O vidro ocupa papel importante nesses requisitos, pois está diretamente relacionado à segurança, conforto ambiental e eficiência energética.”

Para Westphal, que também atua como consultor técnico da Abividro, o setor vidreiro deu um grande passo na consolidação do vidro, frente a outros segmentos, como elemento fundamental para a construção moderna com a criação da prática recomendada ABNT PR 1010 — Aplicação e manutenção de vidros na construção civil. O documento, cujo texto base foi produzido em conjunto pelas equipes da Abravidro e Abividro e contou com a colaboração de diversas entidades vinculadas ao setor da construção, traz um resumo das normas técnicas vidreiras para a aplicação segura e eficiente do produto. “A indústria da construção civil também passou a reconhecer a importância dos vidros de controle solar e insulados como atenuadores de condições extremas em todo o território nacional”, analisa.

Foto: 3000ad/stock.adobe.com

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Sustentabilidade em pauta
As últimas décadas viram a construção civil incorporar conceitos mais amigáveis ao meio ambiente:

  • Nos anos 1980, começou-se a dar mais ênfase à conservação de energia, após as crises do petróleo na década anterior;
  • Nos anos 1990, passou-se a se discutir o aquecimento global e aumentaram as preocupações com o uso de energia nas edificações. Por conta disso, diversos países desenvolveram e começaram a adotar normas de eficiência energética;
  • A partir dos anos 2000, o debate foi ampliado para questões ambientais e sociais, com o termo “desenvolvimento sustentável” sendo usado de forma rotineira. É quando começam a se expandir as certificações ambientais de edifícios, como Leed e Aqua, entre outras.

O papel do vidro
Como vimos na reportagem do mês passado, o processo de fabricação do vidro é menos agressivo ao meio ambiente do que o de outros elementos da construção, incluindo alumínio, cerâmica e concreto. Um estudo da Saint-Gobain feito em parceria com a multinacional do setor de engenharia Arup mostra o impacto dos vidros nas fachadas: o material representa de 26% a 60% do total de emissões de carbono para a confecção dessas estruturas – a variação vai depender, obviamente, da tipologia da fachada e da quantidade de vidro usada.

Hoje, esse tipo de informação influencia diretamente na escolha do que será usado em uma obra: sistemas com baixa pegada de carbono (ou seja, menos poluentes) são cada vez mais o objetivo de construtoras. É por isso que ações das usinas vidreiras para a produção de um vidro mais sustentável, incluindo o maior uso de cacos reciclados entre as matérias-primas e testes com novas fontes de energia, ajudam a colocar o material em uma posição de destaque. Afinal, outras indústrias também estão “descarbonizando” seus produtos e não podemos perder a vantagem que temos no atual cenário.

Durante a especificação dos produtos, deve-se levar em conta todo o ciclo de vida do edifício: como será a instalação desses sistemas? O material precisará ser trocado com frequência? Quais outros benefícios ele pode agregar ao projeto? Nesse sentido, o vidro também sai na frente. “As fachadas envidraçadas ganharam notoriedade não apenas por questões estéticas, mas por questões práticas, de agilidade na construção, facilidade na manutenção e durabilidade”, explica Fernando Westphal. “Tais conceitos estão intimamente ligados ao desenvolvimento sustentável. Vale lembrar que o vidro não é um agente individual, faz parte de um conjunto construtivo. Mas sua durabilidade é alta e proporciona resultados ao longo de toda a vida útil da edificação.”

Foto: Danila Shtantsov/stock.adobe.com

Foto: Danila Shtantsov/stock.adobe.com

 

Valor agregado
Aí entra a importância dos vidros mais modernos. O estudo da Saint-Gobain com a Arup indica que os vidros com revestimento (no caso, os de controle solar) são eficientes na redução da pegada de carbono em um prédio. Além de garantir um “retorno de investimento” na comparação com brises e outras formas de sombreamento, eles têm impacto positivo para a queda de emissões durante o uso do edifício, já que diminuem a necessidade de iluminação artificial, ar-condicionado e sistemas de aquecimento.

A entidade vidreira europeia Glass for Europe iniciou uma campanha para divulgar o potencial de economia energética gerado por esses produtos. Alinhada ao Acordo Verde Europeu (um conjunto de políticas para o combate ao aquecimento global em todo o continente), a associação sugere um grande plano local para retrofits, com o objetivo de trocar os vidros antigos e sem tecnologia das edificações por novas peças de valor agregado. A ideia é ousada e de larga escala, mas ajudará a União Europeia a atingir sua meta de neutralidade de carbono.

  • Se todos os prédios da Europa ganharem vidros de alta performance energética até 2030, seria possível reduzir o consumo de energia elétrica em 29%;
  • Isso representaria uma economia anual de cerca de 875 bilhões de kWh. Para efeito de comparação, o Brasil consome por volta de 467 bilhões de kWh de energia por ano (dados de 2016 da Eletrobrás);
  • Com as trocas, as emissões de CO2 durante o uso dos edifícios cairiam 37,4% em 2050;
  • Cerca de metade dessa economia poderia ser atingida apenas dobrando a taxa anual de retrofits do continente, que hoje representa 2% das obras.

E no Brasil?
Em nosso país, são poucos os registros de retrofits visando ao aumento da eficiência energética de uma edificação. Por outro lado, as novas obras envidraçadas estão ganhando versões tecnológicas de nosso material: prédios comerciais suntuosos como o São Paulo Corporate Towers, o Concordia Corporate Tower (em Nova Lima, MG) e o Vitraux (em Salvador), todos construídos nos últimos anos, contam com fachadas de vidros de controle solar.

Fernando Westphal vê a indústria vidreira mais avançada do que o próprio mercado da construção. Diz ele: “Dispomos de produtos com alto nível de eficiência, mas ainda pouco explorados pela construção civil. O setor residencial, por exemplo, faz pouco uso dessas soluções – não só em relação aos vidros, mas também a outros itens da envoltória, como revestimentos e isolantes”.

A boa notícia é que prédios residenciais parecem começar a olhar para materiais diferenciados. Com conclusão prevista para o fim deste ano, o Seventy Upper Mansion, erguido pela construtora Andrade Ribeiro em Curitiba, terá insulados com a função de garantir conforto térmico e acústico nas suítes dos apartamentos. Será um exemplo interessante para outros projetos se inspirarem e passarem a utilizar soluções robustas.

A receita para mais vidro – e, por consequência, mais obras sustentáveis – é educar arquitetos, engenheiros e demais profissionais da construção em relação aos produtos do setor vidreiro. Assim, poderemos sonhar com um futuro com menos poluição, mais verde e cheio de transparência.

Foto: Roman Babakin/stock.adobe.com

Foto: Roman Babakin/stock.adobe.com

 

Este texto foi originalmente publicado na edição 597 (setembro de 2022) da revista O Vidroplano. Leia a versão digital da revista.

 

Crédito da foto de abertura: Quality Stock Arts/stock.adobe.com



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