Após dois anos de reuniões, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) publicou, em 30 de junho, a emenda que atualiza a principal norma técnica do setor vidreiro nacional, a ABNT NBR 7199. O projeto – coordenado pelo Comitê Brasileiro de Vidros Planos (ABNT/CB-37), órgão sediado na Abravidro – esteve em consulta nacional até o final de maio.
Para esta reportagem especial, O Vidroplano conversou com alguns profissionais que atuaram no trabalho de atualização sobre a importância de repensar o conteúdo da norma, trazendo também explicações sobre as principais alterações do documento (com ilustrações para facilitar a visualização).
Segurança reforçada
Entre as diversas mudanças, o próprio nome da norma foi alterado: ela passa a se chamar Aplicações de vidros na construção civil – Requisitos. “O objetivo dessa grande atualização foi tornar o conteúdo da norma mais completo, reforçando ainda mais a segurança das aplicações com o vidro, além de acompanhar a evolução recente do mercado”, comenta o presidente da Abravidro, Rafael Ribeiro. “Em um momento como esse, é importante celebrar o trabalho feito pelo ABNT/CB-37 para a normalização de nosso segmento. Parabenizo a todos os envolvidos.”
Diversos elos da cadeia participaram do processo, incluindo usinas, processadores, vidraceiros, fabricantes de insumos e entidades da construção civil e de esquadrias. Assim, foi possível discutir as mudanças a serem implementadas de forma plural. Houve intenso envolvimento também da equipe técnica da Abravidro, que começou a trabalhar no tema antes mesmo das reuniões oficiais terem início.
“Após a publicação da revisão da ABNT NBR 7199, em 2016, o ABNT/CB-37 começou a observar algumas necessidades de evolução de seu conteúdo”, explica o gerente de Desenvolvimento de Mercado da Vivix, Luiz Barbosa, que também foi o coordenador da comissão de estudos responsável pela atualização recém-publicada. “Lá atrás mesmo, durante as reuniões, a gente viu que algumas coisas eram necessárias, mas não foram incluídas por falta de consenso. Então, saímos daquele trabalho com uma pequena lista de temas. A relação foi aumentando com o passar dos anos, até que chegou o momento de uma nova rodada de atualização.”
Como acessar
A emenda que atualiza a norma pode ser acessada gratuitamente pelo site da ABNT (clique aqui). No entanto, para entender a emenda, é preciso adquirir a ABNT NBR 7199. A boa notícia é que associados da Abravidro têm acesso gratuito à norma na íntegra, incluindo a emenda com a atualização (e também mais de cinquenta textos técnicos sobre o trabalho com nosso material), por meio do sistema digital ABNT Coleção.
Conheça as principais mudanças
A seguir, O Vidroplano mergulha nas alterações da norma, mostrando os detalhes do novo conteúdo.
ALTERAÇÕES GERAIS

Vidros de segurança
O vidro texturizado aramado deixou de ser classificado como vidro de segurança. Agora, apenas o temperado e o laminado fazem parte dessa categoria. A escolha por retirar o aramado da lista foi feita com base em referências internacionais encontradas na Europa e nos Estados Unidos.
Armazenamento das peças
Na tabela 1 de recomendação de armazenamento das peças de vidro plano por pilha, houve mudança das notas orientativas sobre o empilhamento dos vidros por tipo e também sobre um possível empilhamento maior de insulados – desde que acordado entre fornecedor e responsável pela obra. O texto ainda destaca que o empilhamento de vidros (na obra, indústria ou montadoras de esquadria) deve considerar outros fatores, incluindo a resistência do solo ou da laje, e também do cavalete em que os vidros serão armazenados.
Guarda-corpos
Esse sistema possui norma própria (a ABNT NBR 14718), mas é a ABNT NBR 7199 que define o tipo de vidro permitido para a aplicação. Como o texturizado aramado não é mais considerado vidro de segurança, guarda-corpos só podem ser feitos com laminado de segurança classe 1 ou com insulados compostos por esse mesmo material.
Termoendurecido
O vidro termoendurecido, que ganhou norma própria há poucos anos (a ABNT NBR 16918), foi incluído na ABNT NBR 7199, juntamente com as regras para sua utilização.
Ensaio de esquadria
Na parte que remete para o ensaio da esquadria (item 4.7.2), foram incluídas informações de limitação do uso da tabela de pressões do vento da norma ABNT NBR 10821-2.
Composição dos insulados
A regra para a composição do vidro insulado foi totalmente atualizada para que mais tipos de vidro possam ser usados nesse tipo de conjunto. O termoendurecido, por exemplo, é um deles – dependendo do local da aplicação do insulado.
Vidros temperados
As regras de furação e recortes para os temperados foram excluídas da ABNT NBR 7199, sendo incluídas na revisão da norma do temperado, a ABNT NBR 14698, que ainda será publicada pela ABNT.
TABELA DE APLICAÇÕES
A tabela de aplicações de vidro presente na norma também ganhou alterações para ficar mais informativa. Seu novo formato apresenta de forma clara os requisitos presentes no documento. Além disso, informações adicionais foram incluídas no final da tabela, complementando alguns requisitos. Veja o que mudou nela:
Portas de vidro
As portas envidraçadas só podem utilizar vidros de segurança. Além disso, caso as áreas ao lado da porta tenham vidro, a norma passa a exigir o uso de vidros de segurança até uma distância de 600 mm da porta, em ambos os lados. Ou seja: em toda a altura da porta e áreas laterais a ela até 600 mm de largura, só é permitido o uso de temperado ou laminado de segurança classe 1 ou classe 2. No caso do insulado, ele deve, obrigatoriamente, ser composto apenas por vidros de segurança nas duas faces.

Ambientes especiais
Existe agora a categoria de “ambientes especiais”, aqueles prioritariamente ocupados por crianças ou idosos, destinados a práticas esportivas ou para atendimentos de saúde, assim como áreas com grande concentração de público. Para esses espaços, passa a ser exigido o uso de vidros de segurança até 1,8 m de altura em relação ao piso em todas as aplicações. Essa regra vale para locais como escolas, universidades, brinquedotecas, academias, hospitais, casas de repouso, salões de festas, shopping centers, auditórios, templos religiosos, centros de convenções e restaurantes, entre outros.
Maior segurança contra impacto e queda
Vidro laminado de segurança de classe 1 passou a ser exigência em vãos abaixo de 1,10 m em relação ao piso e dividindo ambientes com desnível maior que 1 m.
Desnível entre ambientes
Antes, era citado apenas na fachada, com a altura de 1,50 m; agora, é citado em outras aplicações, com a altura mudando para 1 m.
Composição dos laminados
O texto informa que, no caso do uso do laminado de segurança, sua composição pode variar em função das especificidades de cada projeto. Em caso da necessidade de maior resistência mecânica, como em instalações autoportantes, o laminado de segurança deve ser composto por vidro temperado. O projetista deve consultar o fabricante de interlayer para sua correta especificação, em relação à capacidade de manter todos os componentes do laminado de segurança aderidos entre si, além de manter a composição estável em situação de quebra de uma ou mais lâminas.
Fachadas inclinadas
A aplicação ganhou uma linha específica na tabela, além de abordar a inclinação positiva e negativa na composição do vidro insulado.
Vidro como revestimento
A aplicação de vidro como revestimento também foi incluída na tabela.
Resistência ao fogo
A linha da tabela que trata o tema agora remete para a norma ABNT NBR 14925, alertando sobre a importância de se verificar a classificação e o tempo de resistência requeridos no projeto.
Novas figuras
Foram incluídas novas figuras sobre:
- Vidros para portas e suas áreas adjacentes laterais
- Desnível entre ambientes
- Limitação de abertura para janelas projetantes
- Inclinação positiva e negativa em fachada
- Vidros instalados em escadas, patamares e rampas
Escadas, patamares e rampas
Vidros instalados a uma distância horizontal menor ou igual a 1,5 m de escadas e rampas, exceto guarda-corpos – pois eles já possuem uma regra específica –, devem ser de segurança até a altura de 1,5 m em relação ao degrau, ao piso do patamar ou do andar.

Outras aplicações
Muros, divisórias e vitrines envidraçadas também devem utilizar apenas vidros de segurança.
Indo além da segurança mínima
O texto destaca, após a tabela de aplicações, que a norma apresenta a regra mínima a ser atendida sobre aplicações de vidros de segurança e recomenda que seja avaliada a utilização destes vidros também nas demais aplicações em que o incremento de segurança é desejável.
Disposições especiais
- Recortes ou furos em vidro float ou texturizado são permitidos somente quando o vidro for aplicado como revestimento
- Existe um requisito novo referente à limitação de resistência dos laminados: quando laminados compostos por vidro comum (float, texturizado), texturizado aramado ou espelho não possuem resistência mecânica para suportar fixações pontuais, eles não podem ser furados ou recortados para essa finalidade. Furos e recortes podem ser feitos somente quando as peças não receberem esforços mecânicos ou não forem utilizadas para sustentação mecânica do vidro
Tabela Que vidro usar? já está atualizada
Desenvolvida pela Abravidro para facilitar o entendimento da ABNT NBR 7199, a tabela Que vidro usar? já está atualizada e disponível gratuitamente para download no site da associação – confira clicando aqui. Esse material é uma importante ferramenta para os profissionais vidreiros, da cadeia do processamento ao especificador, e até mesmo para o consumidor final.

O que alguns participantes da comissão de estudos pensam sobre a atualização?
“A ABNT NBR 7199 é de extrema importância para o nosso setor, pois fornece as diretrizes essenciais para o uso seguro do vidro na construção civil. A recente atualização representou uma iniciativa fundamental para acompanhar a evolução dos materiais e as novas demandas de utilização. Um exemplo relevante é a inclusão do termoendurecido, ampliando as possibilidades de aplicação do vidro com alto desempenho e segurança. A ampliação do uso do vidro de segurança com a obrigatoriedade em áreas de alto risco de impacto, como portas e regiões adjacentes, foi sem dúvida uma das alterações mais relevantes: isso impacta diretamente a segurança do usuário final, reduzindo significativamente o potencial de acidentes graves relacionados ao vidro nesses espaços críticos. Outro aspecto fundamental é o alinhamento com diretrizes internacionais de segurança e qualidade, garantindo que as práticas nacionais estejam em conformidade com os padrões mais modernos e confiáveis do mercado global.”
Douglas Alves, especialista técnico da Eastman para a América Latina
“Sem dúvida, em minha opinião, um dos principais avanços foi o reforço à segurança dos usuários, com a ampliação das exigências de uso de vidros de segurança em áreas críticas, como regiões adjacentes a portas, locais com grande circulação de pessoas, escolas e hospitais. Essa mudança reflete uma preocupação crescente com a proteção das pessoas nas aplicações do material na construção civil. Outro destaque importante é a reformulação da tabela de aplicação da norma, que agora está mais completa e conta com ilustrações que facilitam a interpretação por parte de profissionais e consultores – isso contribui diretamente para a correta especificação dos vidros conforme a finalidade de uso. Também considero positiva a retirada das regras de furação do temperado da ABNT NBR 7199 e sua transferência para a norma específica do produto (ABNT NBR 14698), o que elimina conflitos técnicos e alinha a regulamentação às práticas modernas de processamento.”
Leandro Gonçalves, gerente de Projetos da Divinal Vidros
“A definição das situações em que se deve utilizar os vidros de segurança foi, sem dúvida, a questão que demandou da comissão de estudo maior tempo para se obter o consenso entre os seus membros. Estamos certos de que o resultado alcançado com a atualização da ABNT NBR 7199 atendeu, dentro do possível, todas as partes interessadas. E mais: deixou uma ‘porta aberta’ para que, no futuro, a norma possa avançar ainda mais em relação à segurança. A atualização e ampliação da tabela com os diversos usos e aplicações dos vidros nas construções, na qual as informações são apresentadas de forma bem mais clara e objetiva do que na versão anterior, também contribuirão para aumentar a segurança na utilização. Em relação ao conhecimento da norma, são necessárias ações efetivas de divulgação entre os profissionais que especificam e aplicam os vidros na construção – ações essas que não podem ficar restritas às entidades que representam os fabricantes de vidro e os seus distribuidores no mercado. Cabe a todos os setores envolvidos na elaboração da norma esse trabalho de divulgação. É assim que a CBIC vem atuando ao fazer uso de todos os meios de comunicação que dispõe. A ação das entidades que congregam os projetistas também tem papel importante na disseminação desse conhecimento. No entanto, o grande desafio, independentemente da norma com a qual estejamos envolvidos, é fazer com que ela seja atendida. A existência de ações como as promovidas no âmbito do Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H) podem contribuir para aumentar a conformidade com as normas técnicas, em particular, em relação à ABNT NBR 7199. O envolvimento dos fabricantes de esquadrias (com aplicação de vidro) no PBQP-H, por meio do Programa Setorial da Qualidade (PSQ) desse componente, pode induzir o uso de vidros conformes. Além disso, as construtoras certificadas no PBQP-H têm uma maior consciência da importância do uso de produtos conformes e do atendimento às normas técnicas de projeto.”
Lydio Bandeira de Mello, engenheiro e líder do Grupo de Acompanhamento de Normas Técnicas (Gant) da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC)
“A atualização é um importante avanço para a segurança dos usuários do vidro, sendo uma referência na especificação de projetos onde o material está mais presente em volume e dimensões. Porém, o maior desafio é levar o conhecimento para o momento da especificação, dando a oportunidade do consumidor escolher vidros mais seguros, considerando o perfil de uso do ambiente. A Abividro e o programa Vidro Certo acreditam que o investimento em vidros de segurança, mesmo superior ao estabelecido na norma, será uma escolha do consumidor se ele conhecer os benefícios proporcionados pelo produto. A inclusão de edificações de uso especial e áreas de grande fluxo de pessoas são as mudanças mais relevantes. Elas sinalizam aos consumidores que o vidro deve ser adequado ao uso de cada ambiente, o que se conecta à nossa visão de que o consumidor deve ser informado sobre o vidro aplicado a cada situação, entendendo seus benefícios em cada caso.”
Maurício Fernandes, consultor da Abividro
“As normas técnicas são documentos evolutivos que devem tanto acompanhar as tecnologias disponíveis como garantir a segurança dos usuários. A ampliação do uso do vidro de segurança em toda área de portas e para áreas adjacentes vem consoante com a ampliação da aplicação de vidro nas edificações, seja em obras residenciais ou comerciais, garantindo mais ainda a segurança. Com o advento das partes da ABNT NBR 15575, a ‘norma de desempenho’ – e requisitos como iluminação –, a área envidraçada em janelas, portas e fachada em geral está muito maior que há alguns anos – logo, é uma área mais sujeita ao impacto humano acidental, sendo primordial que os vidros utilizados garantam o bem-estar. Afinal, todo mundo já viu ou conhece alguém que presenciou um acidente com quebra acidental de vidros aplicados em portas ou janelas que podem causar sérios ferimentos. Acho que uma das grandes obrigações na normalização é sempre priorizar a segurança dos usuários.”
Michele Gleice, engenheira e diretora técnica do Instituto Tecnológico da Construção Civil (Itec)
“A constante atualização da ABNT NBR 7199 é fundamental para continuar aumentando a qualidade das edificações, mitigando os pontos de maior risco causados pelos vidros, visando a proteger ainda mais as pessoas que nelas habitam e trabalham. Além disso, essa atualização permitiu um maior alinhamento com normas internacionais, e até mesmo normas nacionais que estavam isoladas, mas que têm seu contexto totalmente vinculado à 7199. Apesar de acreditar que as alterações mais importantes sejam sempre aquelas relacionadas ao aumento da segurança das pessoas, achei muito interessante a inclusão dos termoendurecidos, pois isso deverá trazer maior visibilidade para um tipo de vidro muito utilizado internacionalmente em várias estruturas importantes. Dentro do cálculo estrutural, frequentemente o termoendurecido é uma opção muito interessante, mas ainda pouco explorada aqui no Brasil.”
Pepe Alcon, consultor técnico
“A atualização da ABNT NBR 7199 foi vital, pois realmente demonstra evolução e compromisso com a segurança e a vida das pessoas. Isso fica mais evidente ainda quando se vê que houve uma preocupação do comitê em incluir diretrizes específicas para ambientes especiais como escolas, creches, hospitais etc. É um passo importante para reduzir riscos e promover uma cultura de segurança mais eficaz na construção civil. Entre as alterações, a mais impactante que observei foi a modernização da tabela de aplicações. Com essa mudança, a norma se tornou mais clara e objetiva, proporcionando maior segurança para os usuários. Um aspecto que particularmente me agradou, e aliviou uma preocupação que sempre tive, foi a exigência do uso de laminado classe 1 em aplicações com desnível maior que 1 m em fachadas verticais. Isso demonstra uma preocupação genuína com a integridade física das pessoas, já que o vidro nessa aplicação vai desempenhar um papel tão importante como o de um guarda-corpos em caso de impacto. Agora, é fundamental que os profissionais do setor, como arquitetos, especificadores e consultores, exijam que a norma seja seguida rigorosamente em seus projetos, e que os processadores se mantenham firmes e atualizados em prol dessa evolução. Isso não apenas garantirá a conformidade com os requisitos normativos, mas também contribuirá para a criação de ambientes mais seguros.”
Renato Santana, coordenador de Qualidade e Lean da GlassecViracon
“Na atualização, a comissão de estudo debateu exaustivamente cada proposta de alteração, buscando o alinhamento com as melhores práticas, normas e regulamentos técnicos internacionais, visando a aumentar a segurança dos usuários e moradores de edificações residenciais, comerciais e institucionais. Se considerarmos os acidentes registrados desde 2014 até o presente momento, passamos de vinte casos de óbitos e lesões corporais, todos apresentados e analisados criticamente durante as reuniões. Destaco o equilíbrio entre as partes interessadas compostas por fabricantes de vidros e suas associações (Abravidro e Abividro), fabricantes de esquadrias e guarda-corpos e suas associações (representados por Abraesp, Abie e Afeal), consumidores (representados pelas construtoras e incorporadoras, e por entidades como Abrainc, CBIC, Sinduscons estaduais), organismos de certificação de produtos, laboratórios de ensaios, consultores de mercado e por diversos Comitês da ABNT. A Abraesp participou de todas as reuniões ativamente, apresentando sugestões e apoiando as propostas de alterações, defendendo tanto o aumento da segurança como os interesses das indústrias de esquadrias padronizadas.”
Robson Campos de Souza, gerente técnico da Associação Brasileira das Indústrias de Portas e Janelas Padronizadas (Abraesp)